TRANSTORNO DO HUMOR
O QUE SÃO TRANSTORNOS DO HUMOR?
É uma doença que se caracteriza pela alternância de humor: ora ocorrem episódios de euforia (mania), ora de depressão, com períodos intercalados de normalidade. Com o passar dos anos os episódios repetem-se com intervalos menores, havendo variações e existindo até casos em que a pessoa tem apenas um episódio de mania ou depressão durante a vida. Apesar de o Transtorno Bipolar do Humor nem sempre ser facilmente identificado, existe evidências de que fatores genéticos possam influenciar o aparecimento da doença.
Muitas vezes o paciente não percebe que tem esta enfermidade, e é necessário que familiares e amigos estejam bem informados, e saibam reconhecer alguns dos seus sintomas para poderem encaminhá-lo a um tratamento adequado A pessoa com Transtorno Bipolar do Humor pode apresentar grandes oscilações no seu estado de humor, atrapalhando muito o andamento de sua vida no trabalho, nas relações afetivas e familiares.
A EUFORIA
(Ou mania) É um estado de exaltação do humor, com aumento de energia, sem qualquer relação com o momento que o indivíduo está vivendo. Nesse período do transtorno bipolar, o paciente não está deprimido nem alegre por motivo especial, mas apresenta humor eufórico ou irritável. Em geral, a mudança do comportamento na euforia é súbita, mas o indivíduo não percebe sua alteração ou a atribui a algum fator do momento. O senso crítico e a capacidade de avaliação objetiva das situações ficam prejudicados ou ausentes.
QUE TIPOS DE TRANSTORNOS DO HUMOR EXISTEM?
Os transtornos do humor podem ter frequência, gravidade e duração variáveis. Portanto, a depressão pode ser única ou recorrente (repetir-se várias vezes), de intensidade leve, moderada ou grave e durar semanas, meses ou anos. Se os sintomas persistirem por anos são chamadas de crônicas. Se for leve ou moderada, a pessoa ainda consegue realizar suas atividades, com esforço, algo impossível se ela for grave. A maioria das pessoas que sofre de depressão não acha que está doente porque não está gravemente deprimida, ou seja, incapacitada, desesperada ou angustiada. A distimia é um tipo de transtorno do humor com sintomas depressivos mais leves que da depressão, porém duradouros e oscilantes, em que predominam irritabilidade e mau-humor.
Frequentemente é confundida com a personalidade da pessoa e costuma evoluir para depressão.
Basta uma única fase de hipomania ou mania, precedida ou não de qualquer tipo de depressão acima mencionado, para diagnosticar transtorno do humor bipolar. Depois da primeira (hipo) mania geralmente alternam-se depressões e euforias de intensidade variável.
Existem 4 tipos de transtorno bipolar. Se houve pelo menos um período de mania ou estado misto é bipolar tipo I; quando só aconteceram hipomanias - crises de euforia mais leves que mania - bipolar tipo II. O estado misto caracteriza-se pela superposição ou alternância num mesmo dia de sintomas depressivos e eufóricos importantes. Na ciclotimia se alternam durante anos sintomas de depressão e de euforia ainda mais leves, que duram apenas alguns dias. Pode ser confundida com um jeito de ser "instável", "cheio de altos e baixos" e frequentemente antecede sintomas depressivos e eufóricos mais graves.
Se a depressão, a mania ou o estado misto estiverem acompanhados de alucinações (sentir, ver ou ouvir algo que não existe) ou delírios (pensar algo irreal, como achar-se culpado de coisas que não fez, que está sendo perseguido, que possui poderes especiais, etc. ) trata-se do subtipo psicótico.
O transtorno do humor bipolar também pode ser chamado de transtorno afetivo bipolar ou doença maníaco-depressiva.
COMO TRATAR ALGUÉM COM TRANSTORNO BIPOLAR?
O aparecimento do transtorno bipolar se deve a uma combinação de fatores, em que aspectos biopsicossociais desempenham papel importante no desencadeamento da doença. Assim sendo, tratamentos medicamentosos, orientação sobre a doença e psicológicos estão indicados. O segredo está no encontro da combinação ideal para cada paciente.
ORIENTAÇÃO PSICOEDUCACIONAL
Se o remédio não for tomado, de nada adianta receitá-lo. Para aumentar o sucesso do tratamento é preciso esclarecer o paciente e familiar sobre os sintomas da doença, suas causas, como ela pode seguir durante a vida da pessoa, quais os riscos, que atitudes tomar durante a depressão e na mania, como se preparar para as recorrências e assim por diante. Alguns aspectos são fundamentais. Em primeiro lugar, estará sendo tratado o diagnóstico de transtorno bipolar, não apenas sintomas depressivos ou eufóricos. Levando em consideração que a doença é para a vida toda, podendo hibernar por meses ou anos, o tratamento deve ser planejado para atender as necessidades a curto, médio e longo prazo.
Na orientação acerca da doença também deve ser abordado o preconceito. Resolver dúvidas ajuda a diminuí-lo, mas só o tempo poderá eliminá-lo de vez. Infelizmente pacientes e famílias sofrem durante anos acumulando ressentimentos, queda do poder aquisitivo, atraso na formação, antes da aceitação do diagnóstico e do tratamento.
Outra questão a ser aprendida é como lidar com uma nova crise. Cuidar da decepção, da frustração, da desesperança e, além disso, prevenir consequências prejudiciais são fundamentais na recuperação.
TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
Existem vários tipos de substâncias usadas no tratamento do transtorno bipolar, dependendo do estado em que o paciente se encontra: estabilizadores do humor, antidepressivos, antipsicóticos e tranquilizantes. Para tratar uma crise de depressão pode ser necessário o uso de antidepressivos, se os estabilizadores do humor não forem suficientemente eficazes; numa (hipo)mania apenas estabilizadores do humor podem resolver ou se adiciona antipsicóticos e tranquilizantes. Estes são os tratamentos de fase aguda.
Quando a pessoa já teve pelo menos 3 crises ou uma muito séria e tem o diagnóstico de transtorno bipolar do humor, é aconselhável não adiar o tratamento de manutenção, para evitar ou reduzir a gravidade de novos períodos de doença. Os estabilizadores do humor podem bastar para controlar uma (hipo) mania ou estado misto, mas são os remédios ideais para o tratamento de manutenção ou preventivo de novos episódios do transtorno bipolar.
É importante lembrar que mesmo em curto prazo, o efeito dos medicamentos na depressão, na (hipo) mania ou no estado misto leva pelo menos duas a quatro semanas para ser significativo. A melhora completa pode levar alguns meses e depois disso é necessário manter as medicações usadas na fase aguda da doença por mais algumas semanas ou meses, dependendo da gravidade. Depois de melhorar por completo, não apenas parcialmente, o paciente segue para a fase de manutenção.
Nesta fase normalmente a pessoa se sente bem e corre o risco de descuidar do rigor no tratamento medicamentoso. Da mesma maneira como acontece na hipertensão arterial ou no diabetes, a pessoa se sente bem por estar tomando remédios. Ela não pode parar sem o consentimento do médico achando que está curada.
Felizmente dispomos hoje em dia de vários remédios que podem controlar o transtorno bipolar do humor, de tal modo que se a pessoa não puder tomar algum deles ou não se beneficiar o suficiente, é possível trocá-los ou fazer combinações entre eles. Serão mencionados somente os disponíveis no Brasil.
Estabilizadores do humor são os remédios mais importantes e devem ser usados a partir do diagnóstico de transtorno bipolar. Controlam o processo de ciclagem de um episódio a outro, reduzindo a quantidade de depressões e (hipo) manias e a gravidade delas. Eles variam entre si no efeito antidepressivo e antimaníaco. Os mais estudados e bem conhecidos são o carbonato de lítio, a carbamazepina e o ácido valpróico. Com exceção do lítio, todos eles são também usados como anticonvulsivantes (remédios para tratar epilepsia).
- lítio (Carbolitium“, Litiocar, Carbolim)
- carbamazepina (Tegretol“)
- oxcarbazepina (Trileptal“)
- ácido valpróico (Depakene“)
- lamotrigina (Lamictal“)
- gabapentina (Neurontin“)
- topiramato (Topamax“)
Antidepressivos são o tratamento indicado para as depressões. No paciente com transtorno do humor bipolar o médico primeiro introduz o estabilizador do humor e se não melhorar associa um antidepressivo. Esta cautela reduz o risco de ciclagem para euforia, que os antidepressivos podem desencadear. Se isso acontecer, demorará mais para controlar a doença em longo prazo.
- tricíclicos e heterocíclicos
- Tofranil“, Anafranil“, Tryptanol“, Pamelor“, Ludiomil“.
- inibidores da monoaminoxidase (IMAOs):
- por exemplo, Parnate“, Stelapar“, Aurorix“.
- inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS)
- por exemplo, Prozac“, Cipramil“, Aropax“, Zoloft“, Luvox“.
- novos antidepressivos
- por exemplo, Efexor“, Remeron“, Stablon“, Prolift“, Zyban“.
Antipsicóticos são medicamentos de efeito antimaníaco e antipsicótico. Podem ser usados durante um episódio de depressão, mania ou estado misto se houver sintomas psicóticos.
- de primeira geração - por exemplo, Haldol“, Amplictil“, Stelazine“, Neuleptil“, Melleril“, Navane“.
- novos antipsicóticos - por exemplo, Risperdal“, Leponex“, Zyprexa“, Seroquel“.
Tranqüilizantes representam substâncias com ação hipnótica ou tranqüilizante, que devem ser usados temporariamente, enquanto os estabilizadores do humor não fizerem efeito.
- Valium“, Rivotril“, Lorax“, Lexotan“, Stilnox“.
ELETROCONVULSOTERAPIA (ECT)
A ECT é um dos tratamentos antidepressivos e antimaníacos mais eficazes, indicado nos extremos da mania e da depressão, para prevenir exaustão ou suicídio, pelo rápido tempo de ação. Inclui aplicar pequenas correntes de energia durante rápida aplicação de anestesia geral, para obter uma convulsão de alguns segundos de duração. Jamais deve ser considerado tratamento de última escolha, prolongando inutilmente o sofrimento pela falta de melhora com os medicamentos. É o mais seguro em gestantes e idosos e pode salvar a vida do paciente.
TRATAMENTOS PSICOLÓGICOS
O tratamento medicamentoso é básico, mas o transtorno bipolar não é meramente um problema bioquímico, também psicológico e social. Entrar em contato com os sintomas do transtorno bipolar causa sofrimento e pode ser traumatizante para o paciente e a família. O medo de como isso vai afetar sua vida, o preconceito, a aceitação do diagnóstico requerem atenção psicológica. Para aceitar é necessário conhecer a doença a ponto de diferenciar seus pensamentos e sentimentos e fazer decisões baseado em conhecimento e não em emoções, como medo ou raiva da doença. Tratamentos psicológicos procuram fornecer boas informações, orientação e motivação em um ambiente de apoio e confidencial.
Há vários tipos, dependendo da necessidade específica de cada paciente, como psicoterapias individual ou grupal, terapia familiar ou conjugal e orientação psicoeducacional, como mencionado anteriormente.
Durante o curso do tratamento o paciente costuma enfrentar recorrências, pois o manejo medicamentoso pode demorar até ser acertado. Tais experiências trazem desapontamento, dúvidas sobre o tratamento, sentimentos de culpa e de revolta. Na psicoterapia e na orientação sobre a doença é possível encontrar esclarecimento e apoio necessários para superar cada novo obstáculo que a doença impõe.
PROBLEMAS QUE COMPROMETEM O RESULTADO TERAPÊUTICO
A magnitude das consequências depende da combinação de uma série de fatores: idade de início (quanto mais cedo, mais compromete os estudos e a formação profissional), gravidade dos sintomas, quantidade de episódios, tratamento adequado, aceitação do tratamento, apoio familiar, associação com alcoolismo ou abuso de drogas (praticamente impossibilita o tratamento), associação com outras doenças, características de personalidade (fragilidade, imaturidade, dependência), problemas persistentes considerados sérios pela pessoa.
COMO A FAMÍLIA E AMIGOS PODEM AJUDAR?
Antes de qualquer coisa é necessário conhecer a doença e o tratamento do transtorno bipolar do humor. Mesmo assim, cada novo episódio representa um desafio, porque se misturam problemas individuais, questões pendentes, características de cada família.
O apoio ao tratamento é fundamental para ajudar o paciente em momentos difíceis a manter os medicamentos na dose certa e no horário prescrito. Bastam alguns dias sem tomar a medicação ou tomando menos que necessário para que entre em nova crise. Compreender os sintomas não como seu jeito de ser, mas como doença, alivia muito e reduz o sentimento de culpa no deprimido. O doente em euforia requer firmeza e paciência, porque o relacionamento se torna mais desgastante. Ele pode recusar as orientações da família, alegando que agora toda vez que se sentir feliz e de bem com a vida logo pensam que está em mania. A intervenção junto ao médico antes que perca a autocrítica previne consequências piores ou eventual internação.
- se os medicamentos estiverem causando efeitos colaterais muito incômodos e o paciente mencionar que quer parar com tudo isso, o médico deve ser informado;
- detectar com o paciente os primeiros sinais de uma recaída; se ele considerar como intromissão, afirmar que é seu papel auxiliá-lo;
- falar com o médico em caso de suspeita de ideias de suicídio e desesperança;
- compartilhar com outros membros da família o cuidado com o paciente;
- estabelecer algumas regras de proteção durante fases de normalidade do humor, como retenção de cheques e cartões de crédito em fase de mania; auxiliar a manter boa higiene de sono;
- programar atividades antecipadamente.
- mesmo depois da melhora, há um período de adaptação e desapontamento; é importante não exigir demais e não superproteger; auxiliá-lo a fazer algumas coisas, quando necessário;
- evitar chamar o paciente de louco ou demonstrar outros sinais de preconceito, que favorecem o abandono do tratamento; tratá-lo normalmente e apontar sintomas com carinho;
- aproveitar períodos de equilíbrio para diferenciar depressão e euforia de sentimentos normais de tristeza e alegria.
COMO O PACIENTE PODE SE AJUDAR?
A pessoa mais interessada no próprio bem-estar é quem está doente. O paciente com transtorno bipolar do humor tem uma doença que costuma durar a vida toda, que se mantém sob controle com tratamento adequado. Cabe a ele o esforço de manter o tratamento: é ele quem toma os medicamentos - ou não. Ninguém pode forçá-lo, a não ser em situações que ponham em risco a sua segurança ou a de outros. Portanto, se você é portador do transtorno bipolar:
- comprometa-se com o tratamento - discuta dúvidas com seu médico, eficácia dos estabilizadores do humor, intolerância a efeitos colaterais, etc.;
- mantenha uma rotina de sono; mudanças no sono ou redução do tempo total de sono podem desestabilizar a doença; converse com seu médico, caso precise mudar o hábito de dormir; - evite álcool e drogas; além de interagirem com algumas medicações, também agem no cérebro, aumentando o risco de desestabilização da doença; se tiver insônia ou inquietação, não se automedique - converse com seu médico;
- evite outras substâncias que possam causar oscilações no seu humor, como café em excesso, drinques, antigripais, antialérgicos ou analgésicos - eles podem ser o estopim de novo episódio da doença;
- enfrente os sintomas sem preconceito - discuta com seu médico sobre ele;
- se não estiver podendo trabalhar, "não queime o filme" - é mais sensato tirar uma licença, conversar com a família ou com o patrão, e se permitir convalescer;
- lembre-se: você está bem por tomar a medicação; se parar de tomá-la, mesmo após 5 ou 10 anos, os sintomas podem voltar sem prévio aviso; é preciso manter-se alerta para o aparecimento dos primeiros sinais, como insônia e irritabilidade;
- há indícios de que quanto mais crises da doença a pessoa tiver, mais ela continuará tendo, por isso, procure participar ativamente do tratamento;
- descubra seus sintomas iniciais de nova crise depressiva ou maníaca - tome nota e avise imediatamente seu médico;
- aproveite períodos de bem-estar para redescobrir como você de fato é; como são os sentimentos de tristeza, alegria, disposição e como você lida com seus problemas;
- quanto mais você conhecer a doença, melhor você poderá controlar os sintomas no período inicial; proteja-se: evite estímulos de risco em potencial, como decisões importantes, relações sexuais sem preservativos, projetos ambiciosos, gastos - ponha seus planos no papel e espere para executá-los quando se reequilibrar; procure canalizar hiperatividade ou ideias negativas para atividade física ou manual; se estiver deprimido, dê-se um empurrão, pois a iniciativa está em baixa;
- procure e aceite ajuda da família e dos amigos quando perceber que não consegue se cuidar sozinho.
- é comum querer parar o tratamento, ou porque vai tudo bem, ou porque não está dando certo; procure conversar com outras pessoas com o mesmo problema, que já passaram por isso; lembre-se de como era seu sofrimento; discuta com a família se valeria a pena buscar uma segunda opinião sobre o diagnóstico e o tratamento.
Temporariamente o paciente pode ficar inapto a se tratar adequadamente. Nestas fases a intervenção amiga da família é fundamental.
MENSAGEM FINAL
Há quem considere que o transtorno bipolar do humor "é como um animal selvagem em sua mente, pronto para escapar a qualquer momento", e que precisa de grades fortes para ser contido. Às vezes a porteira se abre um pouco e ele volta a ameaçar - o importante é não deixá-lo à solta. A luta a ser travada com esse animal é longa e difícil, mas vale a pena - vale o resgate da própria vida.
Compartilhar essas lutas com outros pacientes e familiares pode servir de exemplo e motivar quem está a ponto de desistir de si mesmo. São bem-vindas iniciativas como as da ABRATA (Associação Brasileira de Transtornos Afetivos), que auxilia no amparo aos pacientes através da própria experiência com o transtorno afetivo bipolar.
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